terça-feira, 12 de junho de 2012

Relato de Experiência da aluna Letícia Fonseca Fernandes Neves - 6º período de Pedagogia - EAD

RELATO DE EXPERIÊNCIA

Este é o relato de uma experiência que tive no estágio supervisionado
em gestão e docência no Ensino Fundamental, pelo curso de graduação em
Pedagogia da Universidade Newton Paiva, realizado na Escola da Serra,
na zona sul da cidade de Belo Horizonte. Durante três meses, eu
participei de um projeto de intervenção sobre o antigo Egito, com uma
turma de primeiro ano do ensino fundamental, coordenado pela
professora Viviane Vieira.
Eu já tinha um bom relacionamento com a escola devido a trabalhos
anteriormente realizados, então, fui muito bem recebida e acolhida por
todos os funcionários da instituição. Minha primeira impressão foi de
um lugar de ensino aberto à diversidade, em que os alunos se vestiam e
se comportavam cada um à sua maneira, convivendo com crianças de
outras idades, desde que respeitadas as regras básicas de convivência.
Encontrei um espaço confortável, amplo, arejado e com imensas árvores
emoldurando um pátio acolhedor. Quando cheguei à turma destinada,
encontrei uma professora com uma voz suave, tranquila e segura de seu
lugar no grupo e uma turma agitada, animada e predominantemente
masculina de 18 crianças de 7 (sete) anos. A sala tinha produções das
crianças nas paredes e os materiais ficavam disponíveis para o uso de
todos. Não encontrei nenhuma produção de um adulto que, a meu ver,
inibe a livre criatividade das crianças. A sala é de todos para todos
e o principal momento da rotina era a roda de crianças sentadas no
chão, discutindo, decidindo e trocando conhecimento.
A minha primeira impressão foi de uma desorganização provocada pela
agitação das crianças e pela proposta de que cada um se comportasse
"do seu jeito". Eu tinha experiência e certa intimidade com projetos
construtivistas na Educação Infantil, mas me perguntava como
funcionaria quanto se tem conteúdos obrigatórios a serem ensinados,
como é no Ensino Fundamental. Como iríamos abordar conteúdos das
disciplinas se as crianças definiriam seu objeto de estudo a partir do
interesse do grupo?
Bom, quando digo que participei do projeto de intervenção é porque o
projeto não era meu e sim de todo mundo, definido democraticamente em
roda com todo o grupo de crianças e adultos, tinham três na sala (eu,
a professora e o Thiago, auxiliar de classe). Quando comecei a
participar, a turma já tinha definido que pesquisariam sobre o antigo
Egito, porquê, a partir de um livro literário que uma criança levou,
surgiram questões sobre corpos mumificados, pirâmides, papiros e
faraós. As perguntas tinham sido organizadas em uma lista, colada na
porta da sala. À medida que as pesquisas eram feitas em variados
espaços da escola e em casa surgiam novas questões e, a professora foi
categorizando, com as crianças, as perguntas em temas de pesquisa:
corpo humano, animais, escrita, contagem, sistema métrico,
comportamento da sociedade, geografia do local, sistemas econômico e
político...
Todas as pesquisas realizadas geravam um registro, escrito
espontaneamente e individualmente pelas crianças, e eram levadas para
a discussão em roda. Em três meses, investigamos a matemática, a
língua escrita, as artes plásticas, os estudos das ciências sociais e
naturais - conteúdos previstos para o primeiro ano - com o pano de
fundo da civilização do antigo Egito. A professora, depois de muita
pesquisa, sabia exatamente como fazer os ganchos entre as disciplinas
e o tema do projeto. Um exemplo excelente dessa minha observação foi o
dia em que ela levou a história de um faraó que morreu, deixando um
filho ainda criança como seu sucessor. A história conta que, nesta
época, as terras eram medidas pela unidade do tamanho do pé do faraó.
Quando este faraó da história morre, o pé do seu filho era muito menor
do que o seu, criando um problema na comercialização e na valorização
das terras que, "ficaram maiores", com mais pés. O povo tinha um
problema e as crianças da turma também: a necessidade de
universalização do sistema métrico. As crianças foram convidadas a
testar essa questão, medindo os objetos da sala, com lápis e agendas,
assim, cada criança achou uma medida diferente para o mesmo objeto.
Depois elas sugeriram que medissem com a régua, e em um terceiro
momento a professora levou algumas fitas métrica e trenas. No final
dessa história, as crianças entenderam que precisamos "combinar um
jeito de medir as coisas, senão não dá para comparar qual é maior que
qual", segundo a meninada.
Todas as pesquisas e discussões foram feitas assim, através da
experiência, considerando o conhecimento anterior de cada aluno e da
troca de conhecimento entre o grupo. Os adultos nunca se colocavam
como "donos do saber", e sim como mediadores da discussão,
possibilitando que uma criança escutasse a outra, colocando idéias
conflitantes em vóga e organizando aquela aparente bagunça. As
crianças sempre estavam interessadas, iam e voltavam correndo do
banheiro, por exemplo, para não perder nenhuma parte das rodas. Em
alguns momentos, percebia que as discussões ficavam demasiadamente
longas para crianças daquela idade e algumas, com uma capacidade menor
de concentração, "se perdiam" pela sala. Depois de diagnosticado esse
problema, a professora passou a intercalar discussões verbais e
atividades práticas, permitindo com que um mesmo assunto fosse tema de
várias rodas.
O interesse de todos, o envolvimento da turma e as argumentações cada
vez mais elaboradas das crianças, são fatores que me mostraram o
sucesso do projeto de intervenção. O ritmo das pesquisas e dos temas
era ditado pelo interesse da turma. Um assunto podia durar semanas
enquanto outro se esgotava em dias. O nosso planejamento se renovava a
cada roda. Um dia a professora inseriu na roda, a partir de outra
história, o tema do rio Nilo e sua importância para o desenvolvimento
daquela sociedade. Contudo, as crianças tinham visto um documentário
sobre a invasão do Egito pelos romanos. A guerra era o foco naquele
momento. Então, a professora guardou o seu livro e ficamos levantando
hipóteses sobre os motivos da invasão e do fim da civilização egípcia
antiga. As crianças levantaram três hipóteses: se o motivo era a
paixão do Imperador Romano pela Cleópatra, então rainha do Egito; se
era a quantidade grande de ouro que os faraós tinham ou se era a
quantidade de água que o rio Nilo tinha, já que a região é desértica.
Pronto! Mais uma pesquisa para casa foi definida e mais uma roda
animada de discussão foi realizada na aula seguinte.
Minha primeira impressão foi confirmada, era mesmo uma bagunça se
olhássemos com um véu do ensino tradicional do qual viemos. A
professora não respondia as questões, as crianças falavam umas junto
com as outras ansiosas e não se sentavam em carteiras, nem se
locomoviam enfileiradas. Mas era uma bagunça na qual o educador
pacientemente organiza, sendo a escola de todos para todos e a
construção do conhecimento acontecendo a todo tempo, possibilitando,
assim, uma formação efetiva e verdadeira das crianças e dos adultos
através da relação interpessoal.

Letícia Fonseca Fernandes Neves
Aluna do 6º período da graduação em Pedagogia - EAD.

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